terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Maldita Curiosidade


A famosa “Avenida Rio Grande” da Praia do Balneário Cassino não é mais a mesma. Dos meus 21 anos de vida, desde que a freqüento como um homenzinho, muitas coisas mudaram. Dá até medo! Será a globalização? Ou culpa do Bebé? Não sei. Mas eu ainda descubro! Normalmente a madrugada ali é tranqüila. Os mais diversos grupos a freqüentam: rodinhas de violão, hippies, bêbados, trêbados e até desmaiados que fazem dos bancos seus berços de descanso. Mas quarta-feira foi diferente, muito diferente. Chegamos por volta das 20h. Eu e meu brother Vinícius. Caminhamos do início ao fim umas três vezes, quiçá quatro. Nessas idas e vindas, paramos diversas vezes para cumprimentar alguns conhecidos. Alguns deles, nos comentavam sobre um carro parado há mais de horas na esquina da rua Porto Alegre. Um Fiat 147, verde casca de abacate com película solar das mais escuras. Até aí tudo bem. Porém, o curioso era que algumas pessoas – segundo os nossos conhecidos – se dirigiam até o carro, entravam e saíam depois de algum tempo. Entendível até certo ponto, mas ainda curioso – ainda mais para mim. Um Fiat 147? Eu quero ver. (Diga-se de passagem: sou fascinado pelos cascudinhos). Resolvemos voltar por livre e espontânea pressão súbita de minha parte até as imediações da rua Porto Alegre. Sentamos em um banquinho na diagonal ao carro. E ali ficamos por volta de 30 minutos. Mais 25 minutos. E nada! Entre um mate e outro, prosas e comentários (im)pertinentes sobre quem passava pela nossa frente, de repente, uma guria que aparentava ter uns 18, 19 anos, branca, com calça jeans e blusa rosa entra no carro pela porta do carona; enquanto que simultaneamente pela porta do motorista sai uma outra guria bem mais nova, morena, de saia branca e blusa preta. Ah meu Deus! Era verdade o tal comentário ou a fofoca daquelas pessoas. Pensamos na hora: vamos ter que ver de perto. O mais curioso ainda é que o tempo passava e nada acontecia. Mais 50 minutos. Uma hora. A água do mate acabou e as balinhas coloridas em forma de minhoca já estavam no fim. “Que porcaria ser curioso!” – disse o Vinícius. Eu apenas disse um simples: “Pois é!” - sem querer tirar os olhos do carro. E lá seguimos nós tentando decifrar o que estava rolando dentro daquela pequena relíquia de automóvel. Dos pensamentos mais insanos aos mais sem nexo. Um (mo ou ho)tel móvel, um filme (talvez uma temporada inteira de um seriado) ou até pessoas fumando o capeta. Oh céus! Curiosidade poderia ser um pecado. Talvez um dos mais cabulosos, pois todos mudam seu comportamento em virtude de querer descobrir alguma coisa. E lá ainda estávamos nós, esperançosos que descobriríamos o que estava acontecendo, quando mais uma pessoa se aproximou. Esta demorara um pouco para entrar. Pelo jeito, a porta estava trancada ou as pessoas se acomodavam melhor para ela embarcar. “Mais uma guria, meu!” – comentou o Vinícius, louco louco para estar dentro daquele Fiat 147. Afinal de contas, quem não queria? Somos dois e lá dentro, no mínimo, são duas, já que da última vez não saiu ninguém do carro. Ah maldita curiosidade! O tempo passava e o mesmo ritual se repetia. Nada acontecia. Sem luzes dentro do carro, sem balanços, sem fumaças. Enquanto isso, o mondaime já marcava 23h e 17min. Que saco! Lembrei da última música do Gilberto Gil, “Olho Mágico”: “Que saco, como se isso fosse um jeito de bisbilhotar o silêncio”. Era um bisbilhotar alheio que nos prendeu durante horas, pior que ficar entrando em perfis do orkut para saber das últimas mudanças na vida dos outros. É brabo! Mais meia-hora e nada. Quase meia-noite. Até que o Vinícius resolveu ir comprar mais balas para ao menos a gente engordar um pouco e adocicar o tempo que se arrastava. Eu fiquei ali, sentado, num lento ritmo de piscar os olhos. Pimbaaaa! Da onde saiu eu não sei, mas outra guria chegou e entrou direto no carro! Mesmo rápido, percebi que ela era estonteante, avassaladora, perfeita. Se o Vinícius a tivesse visto, ele iria ao menos dizer “Oi guria!” – como se a conhecesse realmente de outras Querências. Quando de repente, depois de mais de 10 minutos, ele voltou e começou a falar:


- Ô meu, não vai lá! Não vai lá!
- Mas qual o problema? Eu só quero ver e fui tu quem me incentivou!
- É que eu também fiquei curioso, mas agora...
- Agora? Travou? (doze segundos depois)
- Suspeito que tenha alguma coisa de errado lá. Não vai!
- Olha quem me diz isso, o mais corajoso da GM!
- Eu sei a hora do perigo e a hora da brincadeira e tenho certeza que o lance é do mal!
- Me alcança o celular e a câmera que eu vou lá tirar isso limpo!
- Ô meu, eu te avisei, depois não vai falar que eu não tentei te impedir!


E lá fui, assaz curioso, com o celular e a câmera em mãos querendo saber o que havia de tão estranho naquele carro abandonado em plena avenida. O que seria um Fiat 147 com três gurias? Nenhum vidro aberto. Nenhuma luz. Nenhum balanço. Comecei a pensar no pedido de atenção do Vinícius, afinal, ele sempre foi o mais destemido da gurizada e agora estava dando para trás. Olhei as horas: 00h e 23min. Me prometi de chegar abordando o carro às 00h e 25min. É, eu costumo marcar horas corretas no relógio como estímulo de tomar coragem, desde pequeno. Atravessei a rua, parei na esquina e as pernas começaram a bambear. Mas ainda firme fiquei e segui mais um pouco, me escorei na parede de uma loja e fingi falar no celular. Faltava menos de um minuto. Caminhei em direção ao carro. Liguei a máquina e abri o celular para dar luz. Apressei o passo. Pulei uma poça d’água. Atravessei novamente a rua para dar o bote indo por trás do Fiat. E faltava menos de 30 segundos. O medo se foi embora. Comecei a estufar o peito e enchê-lo de coragem e não de ar. Caminhei mais um pouco e me escondi atrás de uma árvore. 57, 58, 59... 00h 25min! Sai correndo com toda a cara-de-pau e curiosidade possíveis, coloquei a luz em direção ao vidro, tentei abrir a porta. Estava trancado o lado do motorista. Corri do outro lado para abrir o da carona. Alguém ligou o carro. Engataram a primeira, arrancaram. Passaram para segunda e saíram em disparada para a rua principal, a Avenida Rio Grande. Tentei correr atrás, mas o Fiat 147 se mandou em direção a praia. Nenhuma foto, apenas vultos e sombras das quatro, sim, quatro pessoas que estavam dentro daquela relíquia. A placa eu anotei, mas obviamente não divulgarei. Já a verdade eu não descobri. Porém, uma coisa é fato: casos curiosos só acontecem na maior praia do mundo, a Praia do Cassino.

Um comentário:

Jennifer Azambuja de Morais disse...

Quem sabe um seita? Uma reunião de amigas? Ou uma simples brincadeira para deixar as pessoas curiosas? Bah! A curiosidade me pegou também nessa história. Hehehe..