quinta-feira, 1 de maio de 2008

Meu Amigo Brasil


- Tu tens cara de Brasil!
- Como assim?
- Estás sempre desprevenido!
- Não entendi direito...
- Sem dinheiro... duro!

Depois disso, Juarez nunca fora mais o mesmo. Passaram-se os anos e sempre quando abria a carteira lembrava-se do apelido que o amigo Adriano lhe dera. Mas quem precisa de um amigo desses? Tudo bem que Juarez realmente andava quase sempre com migalhas na carteira, mas o apelido Brasil era algo muito forte, talvez uma alcunha muito pesada. Por que logo o nome do país?

Quando o Juarez saía nas noites frias de Pelotas no seu possante 88, um golzinho daqueles quadrados, antigos, de cor amarela, com calotas compradas em supermercado, os amigos achavam estranho. Como que ele consegue manter esse carro se ele não tem dinheiro nem para comer uma pizza com o pessoal? – pensavam. O segredo de Juarez ter sempre um pé-de-meia garantido para a gasolina e outros pequenos investimentos era quase um segredo capital.

Aos poucos os amigos começaram a segui-lo para compreender de onde ele tirava alguns reais para colocar gasolina no possante. O problema foi que com o tempo o Brasil foi conseguindo mais dinheiro, pois a cada dia aparecia com roupas novas e sapatos bem lustrosos. Uma pinta só. Muitas vezes mais bonito ou mais elegante que os amigos no próprio trabalho e também nas noites de farra. Sem contar ainda nas mais de sete chuteiras, de marcas famosas, diferentes que aparecia nos jogos de finais de semana no campeonato amador da cidade.

O Brasil no começo da carreira amadora de jogador de futebol seguia a tradição dos homens da família: era um zagueiro central. Após alguns anos observando os companheiros de time na sua frente fora avançando nos espaços e se deslocado com o consentimento do técnico para a salvaguarda do meio-campo e, ano passado quando já estava na lateral-direita do campo, fora deslocado para o ataque do Ibiripuano pela qualidade de seu recuo na hora de retornar para marcar quando o adversário lhe atacara, mas especialmente pelo seu potente chute, quase um folha seca de Didi - aquele da Copa de 62. O Brasil galgou a fortes passos a posição mais cobiçada do time: o ataque, o centroavante de ofício. E conseguiu.

Os amigos ficavam estupefatos com aquilo. E o Brasil até percebia, mas ignorava. Seguia o conselho de sua mãe, quando ela lhe dizia em pequeno que o desprezo aos olhares dos invejosos seria a melhor resposta. Seguia firme e forte. Um abrupto convicto. Saía com o seu possante amarelo desbotado bem feliz pelas ruas de Pelotas procurando novos investimentos no setor amoroso e, quem sabe, também no profissional. Para ele, a vida era feita de setores, na verdade, três setores: o pessoal, o social e o profissional – exatamente nesta ordem.

Ele guardava no fundo da gaveta das cuecas de seu guarda-roupa, na primeira gaveta do armário, três pastas organizadas sob a ordem de prioridades. Todas com identificação e última data de atualização. Dentro delas de cada uma delas havia folhas com algumas frases soltas sobrepostas por algumas moedas e cédulas de real. Nunca ninguém descobrira aquelas pastas, nem mesmo a sua querida mãe portuguesa. Aprendera isso com o pai americano que lhe abandonara ainda na adolescência. Um homem sistemático de atitudes rigorosas e incisivas. Naquelas pastas estavam frases relativas a cada uma delas. Frases das quais fazia uso no seu dia-a-dia e os reais dos quais fazia uso de acordo com suas necessidades.

Com o passar do tempo aquelas pastas foram ficando recheadas como se fossem regadas feito uma horta. Os elásticos das pastas já estavam no máximo de esticados quando Brasil tivera a idéia de substituí-las por caixas de papelão que ficavam na garagem de sua casa – na verdade, a casa de sua mãe, da qual ainda não abandonara mesmo com muitos anos de idade. As caixas começaram sendo úteis, mas aos poucos já também estavam abarrotadas e novas caixas foram sendo colocadas. Em poucos anos o quarto de Juarez, o querido Brasil apelidado pelo amigo Adriano, já estava repleto de caixas empilhadas por todos os lados. Era chegada a hora de começar a tomar maiores atitudes.

No dia da final do campeonato lá estava o Brasil em campo dando formas à camisa número nove do Ibiripuano. O sorriso largo, vasto, como se já tivesse feito três gols e corrido para o abraço de sua querida Jujú, na arquibancada improvisada da várzea. Alongava-se. Esticava a perna esquerda. E a direita. Os braços atrás; braços à frente. E o sorriso no rosto. Pulava e cabeceava o infinito. Estava pronto. Os músculos alongados e aquecidos. O jogo já poderia começar. Mas quando o juiz colocara o apito na boca e levantara o braço para dar início ao jogo, o narrador de um canal comunitário que transmitia o jogo ao vivo gritava ao microfone para o juiz parar o jogo, pois um carro estava em chamas no estacionamento do estádio da várzea: o carro de Brasil, o velho e amarelo gol 88.

Brasil abandonaria o campo e sairia correndo para ver o que pudera ainda fazer pela relíquia de calotas pratas e cintilantes. O seu gol 88! O seu amarelinho! Mas não, nada disso. Deslocou-se do meio do campo a passos curtos e despretensiosos em direção a mesa do quarto arbitro, abaixou-se à altura do ouvido do arbitro e cochichara alguma coisa, frases rápidas de no máximo dez segundos. Ninguém da torcida, nem Jujú e nem dos jogadores em campo entenderam a sua decisão. Brasil retornaria para o meio do campo fazendo sinal de positivo para o arbitro do jogo dar início a primeira partida da final. O arbitro colocou o apito na boca e, “Fiiiiiiu”, começou o jogo como se nada tivesse acontecido.

Usando o Juarez como exemplo e coincidentemente pela alcunha que recebera pode-se dizer que o centroavante ex-zagueiro é a fotocópia do país em que vivemos. Um homem humilde e seguro com o passar dos anos, que não se deixou abalar pelos olhos gordos, curiosos e até invejosos dos amigos. Assim como o Juarez, o “Brasil”, o Brasil – o país – finalmente possui agora o patamar de ser um país sério de acordo com números recentemente divulgados pela Standard & Poor's. Em conseqüência também desses números apontam a possibilidade de o Brasil ser em alguns anos uma forte potência mundial embatendo com outros países de ponta.

Um país tão sério como o centroavante Juarez: humilde, paciente, cauteloso e, às vezes, até um goleador nato.

Um comentário:

Mirela disse...

Tá Marquinhos, mas me diz uma coisa: afinal, o que foi que o Brasil falou pro árbitro!? ahuioaHUAIOhouaiHUAI
Porra, tu instiga a minha curiosidade sempre tchê haIUAhoaHIUAhuia
Brasil, um país sério? ...Não sei não heim. Vejamos: levando em consideração a igualdade entre os cidadãos e a democracia atuante, o Brasil pode ser considerado mesmo um país sério, PORÉM, TODAVIA, CONTUDO, ainda existem problemas graves que não são levados a sério pelo governo e até pelos cidadãos. Então, sabe o que que eu acho? Que tens que parar de ler a Standard & Poor's pra eu poder, um dia, comentar algo que preste. ahaouIHAOuihauiHUAIhuai
Beijo Marquito!!
Desculpa, mas eu tô com sono! :P