domingo, 16 de março de 2008

A Carta no Livro


Tenho dois tios por parte de mãe. Um deles é meu dindo, o Gustavo. O outro é o Antero, além de um outro tio postiço, de Pelotas, do qual não tenho notícias faz anos. Mas, de quem irei falar é do Antero. Do meu Tio Antero. O cara é um maratonista! Não no sentido da palavra, no figurativo. Vive correndo aqui e ali para atender a todos os chamados para serviços. Haja gasolina e panturrilhas para ele. Ele já fez papel de meu pai, de meu avô, de psicólogo e até de segurança particular em situações de risco. Ele é polivalente. E, sendo polivalente, ataca em todas as posições do campo, óbvio. O campo da vida.

Ontem, dia de 14 de março, além do 86° aniversário da minha avó paterna, a Fany, a família – a parte materna e alguns da paterna – iriam reunir-se na casa do Tio Antero para comemorar os 38 anos de casado dele com a Tia Sarita, outra guerreira. Para os filhos deles, a General Sarita. 38 anos! Quantos tpm’s o Tio Antero agüentou! E quantas noites a Tia Sarita suportou o ronco dele! Nossa! 38 anos! Já conheci outros casais com mais tempo de casado, como por exemplo, meus avós paternos e maternos. Porém, como o capítulo aqui é sobre o Tio Antero, enfim.

O Tio Antero fez um churrasco caprichado. Vinte e muitas pessoas conversavam enquanto a carne não ficava pronta. Uns bebericando cervejas; outros falando de filmes – o meu amigo Max Cirne iria gostar dessa rodinha. Pouco tempo depois, as pessoas escutaram um: “Tá pronto pessoal!” – anunciado pelo Tio Antero. Em segundos, todos estavam sentados às mesas. Mesa para os adultos, mesas para os adolescentes e mesas para as crianças. Setores, tudo por setores, ordem da Tia Sarita – mal sabia ela o que viria pela frente.

- Pessoal, só um pouquinho da atenção de vocês! – interrompeu o Tio Antero.
- Silênciooooooooo! – gritava a netinha Luísa Emanuelli.

Todos de olhos abertos, decerto curiosos com o pedido do Tio Antero.

- Vou ler um texto, ou melhor, uma carta – e lá começaria ele a dissertar, monologar mais ou menos assim:


14 de Março de 1970


Oi querida!


Não chegarei em casa na hora hoje, pois estou colocando em ordem o trabalho de um colega que faltou por dois dias seguidos. Sabes como sou, não? Sou como o velho e o bondoso pai Homero não consigo deixar o próximo precisando de ajuda ou sem auxilio, sem que eu me ofereça para ajudar. Estou escrevendo pensamentos soltos, palavras de um futuro bom imaginando a nossa vida, juntos, daqui a muitos anos. E pensando muito em ti, em frente a muitos cálculos, papéis e xícaras de café vazias.

Não quero adivinhar o futuro, quero apenas pensar que ele vai ser bom. Por isso, provavelmente esta carta não vá chegar em tuas mãos. Assim que preencher todas as linhas vou amassar esta folha e colocá-la no lixo. São sentimentos verdadeiros que aqui os expresso. Sentimentos puros que tenho por ti e pela nossa família, família essa que em alguns meses aumentará com a chegada do nosso primeiro guri. Eu prefiro Christian, tu preferes André. Por que não temos um filho com um nome composto? É bonito, nossos velhos adorariam! Não esquece que em breve eu quero a nossa guriazinha. E que se o guri for Christian André, ela poderia ter um nome composto também. Quem sabe Christiane Maria? Ou Christiane Regina?

Bem, eu deixo contigo esta decisão. Sei como és. És o meu general, o meu porto-seguro. Talvez nem coloque esta carta no lixo para conferir se daqui 20 ou 30 anos meus desejos serão alcançados. Como seria a nossa vida daqui muito anos? Quantos netos ou netas teríamos? Maldita curiosidade! Maldita pretensão humana! Eu sei que quero a tranqüilidade de uma casa cheia de alegria, de paz e de bastante amor. Simples e ousado ao mesmo tempo, mas é assim que quero. Com nossas famílias nos visitando e fazendo muitos churrascos. Muitos e muitos anos de vida para nós!

Querida, sabes que adoro te falar palavras e versinhos prontos ao pé do ouvido, mas assumo: demorei quase uma hora para escrever esta carta. Decisões importantes são assim, difíceis de serem explicadas. Por isso, vou resumi-las e preparar uma das surpresas de daqui alguns anos. Decidido! Não vou te entregar esta carta hoje e muito menos colocá-la no lixo. Vou guardá-la dentro de um bom livro, a Bíblia, e entregar-te-ei-a daqui a muitos anos em um dia muito especial, em que todos estarão reunidos e ai então conferirei o futuro destes desejos de uma vida feliz. Assim espero que eles aconteçam, assim como o nosso primeiro beijo em frente ao portão da tua casa. Momentos eternos e felizes, tão puros quanto o nosso amor.


Teu Antero



Palmas, palmas e mais palmas. Os desejos do futuro tornaram-se realidade. Decerto, não exatamente do jeito que o Tio Antero esperava. Um futuro com desvios, com desilusões e com muitas outras alegrias fora do plano, da rota pretendida. Hoje, os filhos estão aí. Realizações e presentes do carinha lá de cima: Christian André e Christiane Regina – ele aceita o André, ela detesta o Regina. Uma neta – de nome também composto – cheia de saúde, Luíza Emanuelli, e outros ainda por vir nos próximos anos. As famílias reunidas para comemorar o octogésimo sexto aniversário da avó Fany e mais um ano de casamento, o trigésimo oitavo, ambos por extenso. O Tio Antero fez o caminho dele, sempre correndo atrás do que sempre pretendeu, como ele mesmo disse: “(...) a tranqüilidade de uma casa cheia de alegria, de paz e de muito amor (...)”. Isso resume. Ele é um cara abençoado e feliz. Assim como o Tio Gustavo também é. De uma carta desejando o futuro, o Tio Antero fez por onde, sempre correndo atrás dos seus desejos e superando desafios. Hoje, ele é um verdadeiro exemplo de como vencer na vida. Sendo assim, só posso dizer:

- Parabéns e muito obrigado Tio!

Um comentário:

Lídia disse...

Adoro essas festas onde nos reunimos com familiares! Sempre aprendemos tanto. Linda a carta, deve ter sido um momento especial! Tantos anos após,escreveram livros e um filme sobre a "Lei da Atração"... e ele já sabia O SEGREDO! heheheh Mto show! Beijos.