segunda-feira, 17 de março de 2008

Cinéfilo


Se eu tivesse que eleger um animal para cada amigo meu, diria que o Max é um gato – na figura irracional de um felino, claro. Um gato da noite, não os de madames. Ele adora a escuridão das festas de meio de semana, especialmente os Pubs – além do seu próprio quarto em forma de mini-Pub, o “Le Chat Noir”, na casa de praia. Ele é detalhista, analisa tudo e a todos. É jornalista, isso explica a exatidão do Max, um cara muito sincero, racional. Mais uma freqüente dele é a paixão por tudo que envolva filmes e cinemas. Não é apenas divertimento, é uma fixação, um amor platônico. Decerto, ao nascer seu pai lhe dera uma camiseta promocional do filme “Hellraiser”, uma entrada para “Robocop”, um vale pipoca e um pacote de balinhas de anis. Sim, balinhas de anis! Até porque, em 1987, elas faziam sucesso e não existia ainda os atuais Mentos.

As camisetas e as entradas de cinema foram uma hipérbole para falar do amor do Max pelas tramas cinematográficas. É impressionante. Tenho amigos apaixonados, fissurados por outros assuntos. O Vinícius é fiel às tradições gaúchas; o Guilherme adora a lida com animais pequenos, cachorros e gatos; o Bruno adora questões ligadas a Biologia; o Werner idolatra computadores e jogos de rede e o Max. Bem, o Max é simplesmente um cinéfilo de carteirinha. Não conheço outra pessoa tão fanática por um assunto e que entenda tão bem sobre. Se numa roda de amigos alguém falar no filme mais desconhecido, daqueles repudiados de premiações e até do Oscar, pode ter certeza, o Max sabe o nome do diretor, do roteirista e quem são os protagonistas. Ele só não conta o final do filme porque ele tem ética.

Dias desses, após passar o final de semana em Porto Alegre e ter assistido “Antes de Partir” (2008) com Jack Nicholson e Morgan Freeman comentei com o felino que havia ido ao cinema assistir tal filme. Milagres acontecem, ele ainda não havia assistido. Porém, sabia sobre a história, o diretor, o roteirista, os protagonistas e os coadjuvantes. Ele é sem graça, me cortou o barato de contar até sobre os erros de continuidade que havia achado em algumas cenas. Disso ele não sabia! “Ahá!” – exclamei na hora. De resposta apenas recebi: “Não me conta mais do filme porque eu ainda não assisti e não quero ter que não ver por tua causa!”. Assim, bem direto. Entendi, claro. Resumi-me a insignificância de um mero freqüentador de cinemas. Era óbvio. Era a única saída. A minha única saída.

Semanas antes – talvez meses –, sem deixar de lado o papo sobre filmes, havia comentado com o felino sobre uma colega de faculdade que lhe mirava com uns olhares discretos, bem seguidos. Era o tipo de guria dele. Morena, meia altura e tímida. Era uma pesquisadora inteligente, muito dedicada e com um sorriso de 32 dentes da cor de pipoca sem manteiga. Ele apenas concordava e, em seguida, já mudava o assunto. Falava de festas ou de cinema, claro. Eu insistia. Ele apenas sorria e ficava sem palavras. O roteiro desse filme eu já havia descoberto, era questão de tempo para os dois se encontrarem num desses Pubs de Pelotas, encostarem-se ao balcão, sorrisos e mãos na nuca e cintura... e aí o resto é desfecho de filme de romance pastelão, você sabe, não? Imaginemos... ”Quem Vai Ficar Com Mary?” (1998) ou “Quero Ficar Com Polly” (2004). Sim, o segundo, com Ben Stiller, mais direto como o próprio Max. Exatamente igual. Incorporei o “Tetê Nosferramus, o vidente” assim como você também fez e adivinhamos o final da história do Max e da sorridente moça – o felino não gosta muito desses filmes com finais óbvios, mas eles viveram um deles.

O Max havia sido um galanteador naquela noite. Palavra que meu avô Ernane usava para atribuir características de um conquistador a um homem. Fez-se de difícil, como se não notasse os olhares e desse valor aos pequenos diálogos de corredor de faculdade com a inteligente moça. Twitter, Orkut e MSN? SMS, telefonemas ou cartas? Nada disso. A comunicação era restrita ao Campus II da UCPel, da Universidade Católica de Pelotas. Quiçá um encontro despretensioso pelas ruas de Satolep, mas tudo obra do acaso. Pauta e personagens não se encontrariam até que o Max se infiltrasse como um Billy Costigan (Leonardo DiCaprio) em “Os Infiltrados” (2006) e a tal moça como talvez uma Lara Croft (Angelina Jolie) em “Tomb Raider” (2001). Perfeito, o infiltrado e a guerreira persistente. O final nós já adivinhamos, mas é preciso falar de cinema. O cinema dá emoção, tanta emoção quanto o fechamento do Cine Capitólio, em Pelotas. “Um mistão de raiva e tristeza” – foi o que o felino sentiu. Chorou, claro. Assim como moça dedicada também.

Ambos parecidos. Tão distantes e tão perto ao mesmo tempo. Como uma moeda, ela cara, ele coroa. Ou vice-versa. O destino fez com que a persistência desse certo e a desejo aflorasse para valer, naquela noite de sexta-feira, numa festa no Rua XV. A guerreira e o infiltrado; a pesquisadora e o felino. Dois gatos da noite. Além das aleatórias festinhas com as amigas, ela passa as outras madrugadas em frente ao computador analisando redes sociais, blogs e novas ferramentas digitais; entre artigos e pesquisas pelos livros na própria web, assiste alguns filmes. Já ele, quando não está com a cerveja na mão e distribuindo sorrisos nos Pubs da cidade e região, fica atirado no sofá mirando a televisão e assistindo os últimos lançamentos de filmes em DVD e pulando de Telecine em Telecine, usando a semiótica para compreender a linguagem e os conceitos posteriormente.

O Max entende bastante de filme, ela também. Ela adora pesquisar, o Max também. Os dois amam a noite, como bons e silenciosos felinos. Agiram por debaixo dos panos, pulando de muro em muro quando ninguém esperava nada deles. Ótimos caçadores. Por enquanto o fato não passou de apenas um bar, de umas cervejas. De apenas uma noite. Os sentimentos existem, as vontades também. Agora, alguém tem que ceder! É melhor parar por aqui sem dar informações desse filme com Jack Nicholson, Diane Keaton e com participação especial do Keanu Reeves, porque os felinos, decerto, sabem das cenas e do desfecho dessa trama do começo ao fim. Torço para que os protagonistas felinos saiam do roteiro e da moeda e fiquem do mesmo lado, ou melhor, lado a lado. Assim como “Forças do Destino” (1999) em que...

Pronto, parei.

2 comentários:

Anônimo disse...

Marcos, como já te disse várias vezes, o teu texto é excelente. As azulões inteligentes que tu fazes e esse tom de humor gozador tornam tudo mais divertido e faz com que a narrativa flua rapidamente ganhando ritmo e força. Bom, gostei muito de ter sido uma pauta! Uma surpresa saber que isso era possível e que tinha tanta coisa para falar sobre mim! Se bem que não foi apenas eu a ser analisado né! Boa parte da teus créditos vão para "a felina" também. Legal saber que estás sempre ligado em tudo e que nas mínimas deixas consegues captar um caminhão de sensações. Opinião pra ti não falta. Quero te ver escrevendo esses textos em um veículo de maior acesso, ao lado do David Coimbra (no mínimo)! Sucesso! Abração do teu amigo Max

Dani disse...

"Resumi-me a minha insignificância de um mero freqüentador de cinemas." ahuehauhe pobres de nós
agora, eesse tipo de "galanteio" dificil irrita, ah se irrita! mas q bom q teve um final feliz :D
bjsss