terça-feira, 29 de abril de 2008

Doce Luana


O Juliano em teimar andar de moto acabou, mais uma vez, sendo atropelado por um carro. Pelas suas contas de acordo com as cicatrizes de sua pele, aquele fora o sétimo acidente em cinco anos de vida sobre duas rodas. Para a sorte dele, por mais que tenha sido o mais grave acidente dos sete, acabou superando a dor e depois cada etapa da fisioterapia para recuperar a perna direita que ficara quase que trucidada. Três fraturas na tíbia e duas outras no perônio – sendo uma delas exposta. Com um acidente daqueles, ele realmente era um cara sortudo, nascera virado para a lua. Diferente dos outros, neste último acidente, a recuperação tinha um remédio bem melhor, de nome Luana, a condutora do carro que batera na moto de Juliano.

Acidentes envolvendo motos são muito comuns hoje em dia. Motoboys cortam o trânsito passando entre fileiras de carros, driblando-os e, às vezes, até os atropelando. Sim, as motos atropelam os carros e não apenas ao contrário devido ao tamanho maior de um em relação ao outro. Sim de novo, o Juliano era um motoboy, daqueles destemidos de ir driblando carros e cortando avenidas em sinais fechados. Muito competente pelos prazos de entrega cumpridos bem antes do horário. No mês antes do acidente fora o motoboy no mês na sua central de telentregas, a Rapidinhos do Asfalto. Competente e, em compensação, imprudente.

Com o sinal fechando, correu para alcançá-lo ainda aberto. Sem sucesso. Quando driblou os dois últimos carros que o fecharam o semáforo setou o vermelho enquanto o semáforo da outra rua setava conseqüentemente o verde liberando a mão daquela via. Três, dois, um, plaftboom!, foi-se o Juliano ao chão combatido por um Scénic bege acinzentado dirigido por uma mulher: Luana, a doce Luana.

O transito fechou e nem uma mão nem outra avançava porque eram pedaços de moto espatifada por todas as pistas e um motoqueiro lá, mas lá longe, um pontinho preto de bruços com a cabeça apoiada na beira da calçada da rua ao fundo. Luana desceu correndinho do carro para ver como estava o motoqueiro. Abriu a porta do Scénic do pai dela e saiu correndo. Trajava uma calça de ginástica preta daquelas bem coladinhas e um colete branco. Correu em direção ao Juliano que devia estar morto, decerto. Também, ele havia levantado vôo por uns quinze ou talvez vinte metros, sem contar a distância que deslizara atritando com o asfalto.

- Moço, moço, moço! – gritava ela desesperamente.

E nada de Juliano dar respostas. Pensou em sacudi-lo, mas com um acidente daqueles seria perigoso, talvez ele estivesse com a espinha lesionada ou algumas costelas quebradas perfurando os pulmões. Resolveu então tirar o capacete cuidadosamente para não haver nenhuma alteração na postura final da queda. Quando acabou de tirar o capacete viu um rosto branquinho, desfalecido. Gostara do que vira. Instinto feminino diz muito à primeira vista, ainda mais quando se gosta do que se vê. Aquele rosto a marcara. “Nossa, mas olha o estado dele, olha o que eu fui fazer!”.

Uma sensação de desespero começara a tomar conta de Luana. Nessas horas, ninguém sabe o que fazer. Na verdade as pessoas até sabem, mas não estão em plena consciência de ligar o quanto antes para a emergência e para a polícia a fim de solucionar aquela situação. O psicológico pesa demais. Depois de tirar o capacete e ter o instinto feminino aflorado resolvera ligar para a emergência. Por sorte, uma ambulância que estava naquele mesmo semáforo do acidente fez o resgate de Juliano depois dos carros abrirem passagem. Ufa.

Na ambulância foram Juliano, dois enfermeiros e... Luana. Deixou o carro estacionado na rua do acidente e rumou para o hospital sendo a acompanhante de Juliano. Um motoboy, surrado da vida profissional – e também da pessoal – tendo a companhia e a preocupação de alguém que nem era realmente a causadora daquele acidente.

Já no caminho do pronto-socorro do hospital Juliano abrira os olhos pela primeira vez. Uma fisionomia de dor e espanto, espanto e dor, ao mesmo tempo, que dera origem apenas a perguntas curtas quando avistara aquela mulher loira lhe olhando com um par de olhos negros estralados:

- O que aconteceu? Onde eu estou? Quem é você?
- Calma! Já estamos a caminho do hospital, tudo vai ficar bem!
– falou passando a mão lentamente na testa suada de Juliano.
- Mas quem é você? – insistiu.
- Meu nome é Luana, tu avançasses o sinal vermelho e batesses no meu carro, no cruzamento da Barroso com a Neto...
- Desculpa... e tu estás bem?
- Sim sim, fica quietinho agora, vai ficar tudo bem, querido!

Juliano atendera ao pedido de Luana. Mas por qual razão ela o havia chamado de querido? Não era apenas atenção que latejava naqueles olhos, havia algo a mais. Gostaria daquela sensação de carinho, de preocupação de uma até então estranha pessoa. Luana deveria ter uns 23, 24 anos pela aparência jovem de vestir-se e também pelo rosto límpido que tinha. Uma pele caucasiana de bundinha de nenê, uma linda face realmente. Mulheres com faces límpidas e sublimes são em grande maioria carinhosas e preocupadas. Ela era, ele já tinha certeza disso. E com aquelas mãos branquinhas e com unhas tão bem cuidadas da qual havia ganhado um carinho na testa, nossa. Mas logo com ele, um motoboy tão surrado pelos motoristas e pela própria sociedade. Por que ela o trataria tão bem?

No mesmo instante Juliano esticou a mão direita entre as faixas de segurança da maca-resgate e segurou a mão dela. Precisava ser recíproco não só pela preocupação dela, mas pelo acidente em si que havia ocasionado. Quem sabe até algo a mais? Por que não? – pensou ele. Esticou a mão e segurou firme, como se lhe pedisse atenção e desculpas ao mesmo tempo. Não tinha nada a perder, até porque era um homem solteiro e ela quase certo que também, até porque ela não ostentava nenhuma aliança nas mãos. Havia grande possibilidade de ela ser solteira também. E por sorte, mais sorte ainda de Juliano, ela era solteira.

Depois de cinco dias no hospital para um turbilhão de exames e também da recuperação, Juliano foi para a casa dos pais, na cidade vizinha, em Rio Grande. Lá teve o cuidado de seus responsáveis e atenção que só uma família pode dar. Adivinhe você quem o levou até Rio Grande? Bem, não preciso nem falar. Mas agora com o carro da mãe dela. Juliano ficou durante um bom tempo estirado em sua cama de solteiro. Nesse período, recebia mensagens e ligações da doce Luana. Todos os dias e quando mais de uma ou duas vezes ligações por dia. Preocupação? A preocupação tomava um rumo diferente na vida dos dois. Um novo passo havia sido dado por ambos.

Ontem, depois de meses de recuperação do acidente, os dois saíram juntos pela primeira vez. De carro. Mesmo com a perna direita dolorida por causa do acidente, lá estava o Juliano dirigindo finalmente um carro, excluindo a perigosa moto que só lhe trouxera cicatrizes – ou ao menos experiência e novos acontecimentos – para a sua vida. No banco do carona, ela, Luana, a doce Luana, impregnando o carro dele com um cheiro de iogurte de morango embriagante de fazer o Juliano perder o controle.

É, às vezes, há males que vem para o bem. E, mais do que nunca, se pode dizer que do acaso, os dois deram uma nova chance para novas aventuras, especialmente, para a louca e perigosa aventura de um novo relacionamento, ainda muito recente claro, mas quem sabe, futuro. A primeira marcha fora engatada. Agora só resta a eles não avançarem nenhum sinal vermelho, respeitando as velocidades das placas de sinalização, mas claro, sem se esquecerem de usar o cinto de segurança. Imprescindível.

6 comentários:

Margo Bueno Bendjouya disse...

pobrezinho do juliano...
ou sera pobrezinha da luana...
hehhheheehhehe
yogurt... é tenho uma vaga associação do que poder ser!!!
viva o colete!!!!
bjaooo
sem maiores comentarios... é um literario nato!!!

Lucas Schuch disse...

Hmmmmm!!!
Bela analogia, meu guri. Bela analogia.
SENSACIONAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAL, SENSACIONAL!!!

Anônimo disse...

Marquinhoss!!!
Cumpri meu prometido e vim comentar teu texto!
Como eu tinha te dito, tenho acessado teu blog e acompanhado teus textos, que por sinal são muito bons e tenho gostado muito, e esse não foge da regra, adorei também!!! Parabéns!
Fico na expectativa do próximo!
Lían

MaxCirne disse...

É! O destino! Quem vai lutar contra?!
Bom texto, seu Marcos!
As pistas deixam ainda mais interessante! Abraço

Tatiane Kuhn disse...

oie! :P

Ane Kosinski disse...

Mazááá!! Gostei do txto hein?! Sonoro esse casal Juliano e LUana, pra não fazer outra analogia né... Como diria nossa queridassssa Thaísa, tudo muito jóinha! hehehe bjaummm meu querido!