Eles inventaram um código. Um código para ficarem camuflados dos outros, evitando os olhares atravessados e talvez curiosos dos que estivessem por perto. “Cobertor” era a palavra que o Cacalo e a Didi falavam para se liberarem dos outros. O código tinha um objetivo simples: a aproximação dos dois. Coisa de namorados. Inventavam um diálogo qualquer no qual tivessem de emitir a palavra e a partir daquele momento um dos dois tinha a missão de inventar uma história para se dispersarem do restante das pessoas. Uma saída à francesa.
Namoravam há mais de dois anos. Dois ano, cinco meses e alguns dias. Contavam os dias como se os dias fossem os últimos, mas não eram. Um casal apaixonado entregue aos laços afetivos cheirando a morango da paixão. A cada encontro os olhos brilhavam. As órbitas quase pulavam quando se viam pela primeira vez no dia. Além de namorados, amigos. Uma relação absoluta e afirmativa, daquelas que todo adolescente quer e acaba não tendo por ter que aprender certas lições forçadas que só o amor-vendaval ensina.
O Cacalo e a Didi, antes de namorarem, eram vizinhos de porta. Uma relação caseira, diga-se assim. Foi na porta onde tudo começou. Um bom dia, um olá com a voz ainda tímida. No dia seguinte um oi com um sorriso maroto de interesse e aos poucos as coisas foram andando. Dois bem adolescentes na época. O Cacalo com 19; Didi com 17. Aos poucos foram se conhecendo com diálogos curtos, porém intensos. O famoso diálogo ping-pong, assim como acontece no Programa do Jô – ou deveria acontecer se o Jô não interrompesse tanto o entrevistado. Números de telefone anotados na palma das mãos. Mais tarde uma mensagem de texto. Uma resposta. E outra mensagem. Outra resposta. No outro dia? O primeiro beijo no já extinto Cine Glória da Benjamin Constant. Rápido assim.
Depois daquele beijo tudo esquentou de tal forma que começaram a namorar em menos de uma semana. Intenso, pode se definir assim. Apresentaram-se um para os pais do outro. Cacalo só tinha pai, mas um pai, super-paizão, que fazia pizza, bolo, lavava roupa, levava e ainda o buscava nas festas. A Didi havia adorado o sogrão. Mais um amigo que fazia. E na porta de casa. A vida era bela. Tudo que pedira a Deus. Um homem que gostasse e sentisse aquele friozinho na espinha e uma nova família em que pudesse sentir-se à vontade. No final das contas, um não saía da casa do outro. Almoço na 246, janta na 248; lanche na 248; filme na 246. Um grude só.
E foi por causa dessa união que começaram a perceber os problemas de estarem sempre próximos às famílias. Beijavam-se claro, mas apenas beijinhos instantâneos, sem carinhos na nuca e mãos escorrendo pelas curvas dos corpos. Agüentavam até. Só que como tudo na vida tem um limite, ambos começaram a ficar incomodados com o costume das famílias sempre presentes. Gostavam da avó do Cacalo, a dona Josefa, que contava histórias da colonização italiana em Caxias. Brincavam com o irmão de Didi, o Otavinho, um gurizão esperto de sabido. Os dois se atiravam no chão e brincavam de siga o mestre e até de quebra-cabeça humano. Mas e os beijos? E um tempo só para eles? Precisavam achar um jeito escondidinho, de saírem à francesa.
Decidiram se afastar aos poucos, em doses homeopáticas, de suas famílias. Conviviam menos na casa do outro. Começaram a ficar mais pela porta, apenas conversando durante umas horinhas. Faziam uma social jantando de quando em vez com as famílias. Só que como para toda ação há uma reação e nada é inabalável, crises no relacionamento surtiram. Crises com os dois? Não, não. Crises no relacionamento para com as famílias. O paizão do Cacalo perguntava por que a Didi não aparecia mais tanto na casa deles. A mãe dela a questionava se alguma coisa estava errada no namoro com Cacalo. Moravam tão perto! Talvez fosse esse o problema – pensava a dona Sônia, mãe da Didi. Nada disso. Tiveram de recuar no plano e traçarem novas estratégias.
Pelo MSN e pelo Orkut acabaram definindo um novo plano. Haveriam de conviver com as famílias numa boa, até porque gostavam realmente de estarem próximos delas. Eram famílias contemporâneas, bem atualizadas em receber o cônjuge temporário – ou não – dos filhos em suas casas. O pai da Didi, o Juliano, sempre dizia para os amigos no trabalho: Prefiro a minha filha em casa com o namorado, no meu campo de visão, do que os dois na rua. Coisa de pai, um pai moderno. Com base nisso, a Didi propunha um novo plano, uma nova estratégia para burlarem a segurança máxima dos pais:
- Cááá, já sei a solução para os nossos problemas!
- Não vale ter que pular muro e nem mentir para eles, hein?!
- Nada disso, o lance é omitir!
- Diiii, omitir é mentir! Tu sempre me falasses isso...
- Me expressei errado, deixa eu te explicar direitinho. O plano é o seguinte: sempre quando quisermos sair de perto deles, falamos uma palavra e a partir dela um de nós começa a inventar uma história ou até inventa um programinha, nem que seja um cinema ou ir à casa de algum amigo nosso!
- É... um código é uma boa sim! Mas qual palavra? Tem que ser algo despretensioso!
- Hmmm... cobertor!
- Fechado.
A partir daquele momento tinham em mãos um novo plano. Talvez nem desse certo, mas tinham que experimentar. Precisavam ter momentos sozinhos. Cinema? Nada de levar o Otavinho, talvez um dia lá que outro. Almoçar fora? Sem levar a dona Josefa, quiçá uma vez na semana. Precisavam ficar juntos, terem tempo para eles. Mas para isso, necessitavam aplicar o golpe. E foi de imediato, no meio de um diálogo na sala entre um intervalo de novela que o Cacalo começou a aplicá-lo:
- Pai, hoje eu fui ao banheiro de madrugada e passei para dar uma olhada na vó. Tava um baita frio e ela destapada, sem nenhum cobertor na cama! – no mesmo instante a Didi já olhou de imediato para Cacalo e ficou esperando a chance de começar uma história.
- Pois é meu filho, já que está no intervalo e ela está no banheiro vou aproveitar para colocar o cobertor na cama da nossa velha! – e lá se foi o pai sem dar oportunidade de Didi complementar com uma história.
Os dois se olharam e sussurraram apenas com os olhos, seria a hora de sair dali? Não precisariam nem inventar história alguma na hora. Talvez mandassem uma mensagem ou ligassem depois para avisar. Noite de sexta-feira e sem aula no sábado. O pai em casa cheio de trabalhos e avó que se deitava cedo quando não ficava tricotando. Cenário perfeito. O plano havia dado certo, melhor do que haviam combinado. Poderiam ficar sozinhos ou talvez irem a uma pizzaria e depois a uma festa. Esticariam a noite, decerto. Não pensaram mais que duas vezes. Saíram pé por pé, Cacalo passou a mão na chave do carro e se foram porta a fora silenciosamente.
Minutos depois enviaram uma mensagem para os pais avisando que tinham resolvido de última hora saírem para jantar e ainda pretendiam ir a uma festa com os amigos. Amigos? Talvez duas ou três horas deles! Depois iriam aproveitar e matariam a saudade acumulada por causa do primeiro plano que havia falhado. Você sabe como é isso. Namorados e na fase da adolescência onde tudo é motivo para os hormônios saírem do ponto neutro. Chegariam lá pelas cinco ou seis da manhã e assim aconteceu. Pé por pé, rumaram para suas casas, para os seus respectivos quartos sem precisar falar por onde haviam ido, com quem haviam andado e quanto haviam gastado. Sem contas, sem explicações.
Aquele código conseguira obter sucesso. Hoje, depois de um ano e cinco meses e alguns dias ainda continuam usando o mesmo formato até hoje, incluindo uma outra palavra: “almofada”. Um código bobo e eficaz, resistente! Isso tudo numa relação entre adolescentes. Mas você já imaginou o que anda acontecendo lá em Brasília? Na verdade nem é preciso imaginar muito, pois há exemplos concretos todos os dias em todos os meios comunicativos. Códigos de ética ignorados e burlados através de CPI’s e dossiês. Triste realidade em cima da fácil maleabilidade das regras brasileiras.
De tudo isso, se pode afirmar que a estratégia do Cacalo e da Didi não chega nem aos pés das maracutaias politiqueiras. Os dois mal gastam dinheiro, não fazem viagens desnecessárias e não precisam de R$ 60 mil reais para manter 25 servidores como laranjas. Vivem das mesadas dos pais e dos dinheiros que tiram dos estágios. Só precisam realmente daquele código para conseguir o que querem. Nada mais e nada menos. Já os outros lá em cima, bem, de códigos não sabem porque não os seguem e nem lhes convêm seguir. Bem que poderiam largar do suculento seio da pátria e fazerem o que lhes foi confiado. Lembrei de algo muito importante: o processo eleitoral já está chegando! Acalme-se, as mudanças começarão em breve. Já é hora de formularmos um código para sairmos à francesa de perto desses sanguessugas. Que tal "caixa-dois"?
Namoravam há mais de dois anos. Dois ano, cinco meses e alguns dias. Contavam os dias como se os dias fossem os últimos, mas não eram. Um casal apaixonado entregue aos laços afetivos cheirando a morango da paixão. A cada encontro os olhos brilhavam. As órbitas quase pulavam quando se viam pela primeira vez no dia. Além de namorados, amigos. Uma relação absoluta e afirmativa, daquelas que todo adolescente quer e acaba não tendo por ter que aprender certas lições forçadas que só o amor-vendaval ensina.
O Cacalo e a Didi, antes de namorarem, eram vizinhos de porta. Uma relação caseira, diga-se assim. Foi na porta onde tudo começou. Um bom dia, um olá com a voz ainda tímida. No dia seguinte um oi com um sorriso maroto de interesse e aos poucos as coisas foram andando. Dois bem adolescentes na época. O Cacalo com 19; Didi com 17. Aos poucos foram se conhecendo com diálogos curtos, porém intensos. O famoso diálogo ping-pong, assim como acontece no Programa do Jô – ou deveria acontecer se o Jô não interrompesse tanto o entrevistado. Números de telefone anotados na palma das mãos. Mais tarde uma mensagem de texto. Uma resposta. E outra mensagem. Outra resposta. No outro dia? O primeiro beijo no já extinto Cine Glória da Benjamin Constant. Rápido assim.
Depois daquele beijo tudo esquentou de tal forma que começaram a namorar em menos de uma semana. Intenso, pode se definir assim. Apresentaram-se um para os pais do outro. Cacalo só tinha pai, mas um pai, super-paizão, que fazia pizza, bolo, lavava roupa, levava e ainda o buscava nas festas. A Didi havia adorado o sogrão. Mais um amigo que fazia. E na porta de casa. A vida era bela. Tudo que pedira a Deus. Um homem que gostasse e sentisse aquele friozinho na espinha e uma nova família em que pudesse sentir-se à vontade. No final das contas, um não saía da casa do outro. Almoço na 246, janta na 248; lanche na 248; filme na 246. Um grude só.
E foi por causa dessa união que começaram a perceber os problemas de estarem sempre próximos às famílias. Beijavam-se claro, mas apenas beijinhos instantâneos, sem carinhos na nuca e mãos escorrendo pelas curvas dos corpos. Agüentavam até. Só que como tudo na vida tem um limite, ambos começaram a ficar incomodados com o costume das famílias sempre presentes. Gostavam da avó do Cacalo, a dona Josefa, que contava histórias da colonização italiana em Caxias. Brincavam com o irmão de Didi, o Otavinho, um gurizão esperto de sabido. Os dois se atiravam no chão e brincavam de siga o mestre e até de quebra-cabeça humano. Mas e os beijos? E um tempo só para eles? Precisavam achar um jeito escondidinho, de saírem à francesa.
Decidiram se afastar aos poucos, em doses homeopáticas, de suas famílias. Conviviam menos na casa do outro. Começaram a ficar mais pela porta, apenas conversando durante umas horinhas. Faziam uma social jantando de quando em vez com as famílias. Só que como para toda ação há uma reação e nada é inabalável, crises no relacionamento surtiram. Crises com os dois? Não, não. Crises no relacionamento para com as famílias. O paizão do Cacalo perguntava por que a Didi não aparecia mais tanto na casa deles. A mãe dela a questionava se alguma coisa estava errada no namoro com Cacalo. Moravam tão perto! Talvez fosse esse o problema – pensava a dona Sônia, mãe da Didi. Nada disso. Tiveram de recuar no plano e traçarem novas estratégias.
Pelo MSN e pelo Orkut acabaram definindo um novo plano. Haveriam de conviver com as famílias numa boa, até porque gostavam realmente de estarem próximos delas. Eram famílias contemporâneas, bem atualizadas em receber o cônjuge temporário – ou não – dos filhos em suas casas. O pai da Didi, o Juliano, sempre dizia para os amigos no trabalho: Prefiro a minha filha em casa com o namorado, no meu campo de visão, do que os dois na rua. Coisa de pai, um pai moderno. Com base nisso, a Didi propunha um novo plano, uma nova estratégia para burlarem a segurança máxima dos pais:
- Cááá, já sei a solução para os nossos problemas!
- Não vale ter que pular muro e nem mentir para eles, hein?!
- Nada disso, o lance é omitir!
- Diiii, omitir é mentir! Tu sempre me falasses isso...
- Me expressei errado, deixa eu te explicar direitinho. O plano é o seguinte: sempre quando quisermos sair de perto deles, falamos uma palavra e a partir dela um de nós começa a inventar uma história ou até inventa um programinha, nem que seja um cinema ou ir à casa de algum amigo nosso!
- É... um código é uma boa sim! Mas qual palavra? Tem que ser algo despretensioso!
- Hmmm... cobertor!
- Fechado.
A partir daquele momento tinham em mãos um novo plano. Talvez nem desse certo, mas tinham que experimentar. Precisavam ter momentos sozinhos. Cinema? Nada de levar o Otavinho, talvez um dia lá que outro. Almoçar fora? Sem levar a dona Josefa, quiçá uma vez na semana. Precisavam ficar juntos, terem tempo para eles. Mas para isso, necessitavam aplicar o golpe. E foi de imediato, no meio de um diálogo na sala entre um intervalo de novela que o Cacalo começou a aplicá-lo:
- Pai, hoje eu fui ao banheiro de madrugada e passei para dar uma olhada na vó. Tava um baita frio e ela destapada, sem nenhum cobertor na cama! – no mesmo instante a Didi já olhou de imediato para Cacalo e ficou esperando a chance de começar uma história.
- Pois é meu filho, já que está no intervalo e ela está no banheiro vou aproveitar para colocar o cobertor na cama da nossa velha! – e lá se foi o pai sem dar oportunidade de Didi complementar com uma história.
Os dois se olharam e sussurraram apenas com os olhos, seria a hora de sair dali? Não precisariam nem inventar história alguma na hora. Talvez mandassem uma mensagem ou ligassem depois para avisar. Noite de sexta-feira e sem aula no sábado. O pai em casa cheio de trabalhos e avó que se deitava cedo quando não ficava tricotando. Cenário perfeito. O plano havia dado certo, melhor do que haviam combinado. Poderiam ficar sozinhos ou talvez irem a uma pizzaria e depois a uma festa. Esticariam a noite, decerto. Não pensaram mais que duas vezes. Saíram pé por pé, Cacalo passou a mão na chave do carro e se foram porta a fora silenciosamente.
Minutos depois enviaram uma mensagem para os pais avisando que tinham resolvido de última hora saírem para jantar e ainda pretendiam ir a uma festa com os amigos. Amigos? Talvez duas ou três horas deles! Depois iriam aproveitar e matariam a saudade acumulada por causa do primeiro plano que havia falhado. Você sabe como é isso. Namorados e na fase da adolescência onde tudo é motivo para os hormônios saírem do ponto neutro. Chegariam lá pelas cinco ou seis da manhã e assim aconteceu. Pé por pé, rumaram para suas casas, para os seus respectivos quartos sem precisar falar por onde haviam ido, com quem haviam andado e quanto haviam gastado. Sem contas, sem explicações.
Aquele código conseguira obter sucesso. Hoje, depois de um ano e cinco meses e alguns dias ainda continuam usando o mesmo formato até hoje, incluindo uma outra palavra: “almofada”. Um código bobo e eficaz, resistente! Isso tudo numa relação entre adolescentes. Mas você já imaginou o que anda acontecendo lá em Brasília? Na verdade nem é preciso imaginar muito, pois há exemplos concretos todos os dias em todos os meios comunicativos. Códigos de ética ignorados e burlados através de CPI’s e dossiês. Triste realidade em cima da fácil maleabilidade das regras brasileiras.
De tudo isso, se pode afirmar que a estratégia do Cacalo e da Didi não chega nem aos pés das maracutaias politiqueiras. Os dois mal gastam dinheiro, não fazem viagens desnecessárias e não precisam de R$ 60 mil reais para manter 25 servidores como laranjas. Vivem das mesadas dos pais e dos dinheiros que tiram dos estágios. Só precisam realmente daquele código para conseguir o que querem. Nada mais e nada menos. Já os outros lá em cima, bem, de códigos não sabem porque não os seguem e nem lhes convêm seguir. Bem que poderiam largar do suculento seio da pátria e fazerem o que lhes foi confiado. Lembrei de algo muito importante: o processo eleitoral já está chegando! Acalme-se, as mudanças começarão em breve. Já é hora de formularmos um código para sairmos à francesa de perto desses sanguessugas. Que tal "caixa-dois"?
Um comentário:
Pra tu não ficar falando q não passo no blog, q não leio, q isso e aquilo.
SAFADÃO!!!
Aquele abraaaaaaaasssssss!!
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